segunda-feira, 27 de junho de 2011

Crônicas Para Ler na Escola



Abaixo um delicioso texto de “Crônicas Para Ler na Escola” de Marcelo Rubens PaivaObjetiva. Eu recomendo.

DR

“Amor”

“Oi?”

“Fala comigo.”

“Fala...”

“Amorzinho?”

“Que?”

“Presta atenção.”

“Tô prestando.”

“Amor, pára de ler.”

“Agora?

“Conversa comigo.”

“Mas agora que estou embalado.”

“Só um pouquinho.”

“Bem no meio...”

“Toda vez é a mesma coisa.”

“Que foi?”

“Quando quero conversar, você começa a ler”

“Não é o contrário, quando começo a ler, você quer conversar?”

“Chega! Agora to mandando. Conversa comigo.”

“Tá, tá... Então, sobre o que você quer conversar?”

Pausa.

“O que você está lendo?”

sexta-feira, 24 de junho de 2011

TAMANHA DIFERENÇA




Arrepare não, mas enquanto eu engomava a calça, dona Conceição, minha mãe, se ocupava do almoço e da pule do bicho que talvez lhe premiasse com algum terno ou duque de dezena na PT (Para Todos) daquele sábado – gozado que apostar no bicho virou hábito de minha mãe e de todo o povo da terceira idade no bairro onde ela mora. Bom. Mas não é disso que quero falar... Enquanto eu passava a calça que acabara de encurtar a barra (por que será que em toda calça nova sou obrigado a mexer no comprimento? Nunca, na minha existência, teve umazinha só que ficasse perfeita), na televisão da sala rolava um programete vespertino cheio de futilidades, com celebridades novelísticas globais sendo entrevistadas por uma loira cujo marido narigudo viria, logo a seguir, entulhar mais ainda o mesmo canal de tevê com outro programete de entretenimento insignificante. Mas também não é disso que quero falar... Dona Conceição na cozinha com seus afazeres, eu na sala lidando com a calça e com o moderno ferro elétrico bom para passar até encerado de caminhão. Eu absorto em alguma coisa que não tão relevante quanto o que se passava na televisão. Porém, sou demovido da idéia anterior de desligar o aparelho de tevê porque surge na tela a mais formosa dama do lotação, a dona Flor, a Gabriela do cravo e da canela. Belíssima. Sorridente num tubinho preto, desfilando na passarela do meu coração (ops,exagerei no lirismo), do SPFW São Paulo Feshion Week. Com os cabelos negros soltos ela vai de um lado a outro, sempre sorrindo, cheio de curvas, diferentemente das magricelas, das tísicas, das defuntas que abundam (sem bundas) nesse famoso e badalado evento da moda paulistano. Sônia Braga, a mais perfeita tradução da beleza, da sensualidade brasuca (desejo masturbatório de todo nerd e cafá dos anos 70 e 80), aos 61 anos de idade, era a personalidade reportada no programete. “ Jisuis! Quanta gostosura! Que bitelão de mulé!!”, exclamei. Mi madrecita, da cozinha, ouviu meus louvores e quis saber o que se passava... “É a deusa Sônia Braga, mãe! A sexagenária mais boazuda deste país está desfilando na Feshion Week”, respondi. “Manhê, eu trocaria duas de 30 pela Sônia Braga de 61...” “Credo! Que mau-gosto”, disse minha mãe lá da cozinha. “Que isso, mãe!! Tô falando da Tigresa que até o Caetano traçou.” E dona Conceição: “Xiii! Cê gosta dessa velha sem graça?” “Ô, mãe, eu viveria o resto da minha existência só na safadeza com essa mulher”, retruquei. “Quê que deu em você? Só pode tá doente...” Intervalo no programete. Fim das imagens da musa na tevê. “Concordo que a Sônia Braga envelheceu, mãe, mas ela tá mais em cima que muitas luanas-piovanis e déboras-seccos”. Minha mãe discorda de tudo que digo da deusa, e ainda me chama de doido. “Só maluco ou intereceiro vê beleza nessa sem-graça”. As despeitadas dirão que é plástica (mais botox e silicone) que mantém sexagenárias como Sônia Braga e Vera Fischer ainda apetitosas. “Não sabia que você gostava tanto dessa velha insuportável... seu gosto me dá nojo ”. Termino de passar a calça nova e vou pra cozinha onde minha mãe está confabulando sobre em que bicho pôr sua fé. “Dona Conceição: como meu tesão pela Sônia Braga lhe causa ‘nojo’??”, pergunto já com certa irritação. “Xiii! Falha nossa, meu filho!” Rindo muito, minha mãe tenta se desculpar. “Rarará! Desculpe! Quem tá ficando velha sou eu... é que eu podia jurar que você disse ‘ANA MARIA BRAGA" e não ‘SÔNIA BRAGA'’”. “Creeeedo, mãe! Quanta diferença!!

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Meia-Noite em Paris.

Indagorinha voltei do cinema donde fui ver a divertidíssima comédia-romântica “Meia-Noite em Paris”. Uma fantasia de Wood Allen falando daquele desejo que a gente tem de voltar no tempo – num tempo que gostaríamos de ter vivido (e por lá encontrar nossos ídolos). Ah, e como é bom rever a belíssima Marion Cotillard (do filme “Piaf”). Sem esquecer da refinada trilha que vai de Cole Porter à Josephine Baker, passando pelos clássicos do Charleston.

Recomendadíssimo.


quarta-feira, 22 de junho de 2011

Prego na Testa

Amigos: “Prego na Testa” é um monólogo bacanudo que Hugo Possolo traz de volta ao Espaço Parlapatões (em quatro únicas apresentações: somente aos sábados à meia-noite – de 18/06 a 09/07 ). Possolo dá um show interpretando 9 personagens numa afiada comédia sobre a neurose urbana. O texto é de Eric Bogosian e a adaptação e direção são de Aimar Labaki. Ingressos 30 pilas (inteira) 15 (meia).

Veja abaixo o vídeo com trechos da peça e prepare-se para ver como o palhaço-bomba faz de seu humor corrosivo uma reflexão sobre nosso dia-a-dia.

domingo, 5 de junho de 2011

Porradaria de Ibsen




Mestre Nelson Rodrigues dizia que há certas coisas que não se devem praticar pra não bulir na alma, como exemplo a psicanálise. Outra coisa, acredito eu, é ver uma peça do Ibsen. Afirmo que depois de assistir a excelente montagem de “Espectros”, que está em cartaz no Sesc Consolação, ninguém será mais o mesmo. Saí do teatro nesta sexta-feira, sem rumo, desnorteado; nunca um espetáculo teatral me abalou tanto. A gente nasce ouvindo dizer que somos os tais, donos de nossa existência, daí primeiro vem a família nos dar régua, depois igrejas, escolas fazendo outras conexões. Quando damos conta, estamos fodidos, cheios de fantasmas, “espectros” que, de algum jeito, precisam ser exorcizados. E é nessa cruzada que a dramaturgia do autor é supimpa. Imagine que todos os heróis dos romances e peças teatrais do século 19 eram vítimas de inimigos externos, então surge Henrik Ibsen inovando toda a dramaturgia do período dizendo (expondo na lata) que há um grande “inimigo” dentro de cada um. As emoções vão se desencadeando num ritmo crescente. Os personagens vão se revelando; todos são vítimas e filhosdaputa ao mesmo tempo. E eu ali, sentado na segunda fileira, embasbacado principalmente com atuação da atriz Clara Carvalho, que dá vigor a uma senhora de família, Helene Alving, que evidencia os segredos do passado do marido ao pastor Manders (Nelson Baskerville) que no seu mundo conservador e hipócrita, reage dubiamente diante dessas revelações.
Em 1879, a peça “Casa de Bonecas”, de Ibsen, causa polemica em toda a Europa com a história de uma esposa que abandona filho, marido para se entender com ela mesma. A crítica moralista da época caiu de pau porque imagine o escândalo que é uma mulher desfazer o lar por qualquer motivo. Está bem. Então, em 1881, o autor causa novo reboliço com “Espectros”, cuja história é a da esposa que revela todos os seus tormentos de mulher, por justamente “não” abandonar o casamento ou a família. Sensacional, não? Ah! E pra dar um ingrediente a mais ao texto, Ingmar Bergman traduziu e adaptou Espectros em 2003 (que foi sua última montagem no teatro, antes de sua morte em 2007). Entonces, caramigos, se acharam que dá pra encarar, corram pois Espectros, que tem direção de Francisco Medeiros, termina temporada no Sesc Consolação em 19 de junho. Os ingressos custam entre 16 e 32 realitos e o endereço é Rua Dr. Vila Nova, 245 – tel: 3234 3000. Mais informações no
http://www.sescsp.org.br/


Aquelabraço do Zeca desconfigurado depois de Ibsen.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Deixem as Putas em Paz!!



Se a própria Organização das Nações Unidas proclama o dia 2 de junho (hoje) como Dia Internacional das Prostitutas é porque há o reconhecimento do papel social digno das putas em quase todas as sociedades, certo? Certo! Entonces, tá passado da hora de certas pessoas, igrejas e ONGs darem o tempo com o papo de “recuperar, reintegrar, resgatar” as nossas educadoras/consultoras sentimentais. Deixem nossas Ana-Bolenas em paz, caraca!! Parem de ver somente abjeção e mercantilismo nessas profissionais (mulheres babilônicas se ofereciam durante o culto à Milita numa prática com fins meramente religiosos, sem a troca pelo vil metal). Nesta semana li “O Doce Veneno do Escorpião” e me decepcionei porque o desejo de Bruna Surfistinha (ou Raquel Pacheco, seu verdadeiro nome) era juntar uns trocos, virar famosidade e largar a profissão. Uma lástima. Até o grande cronista popular (e meu ídolo) Odair José já quis tirar sua quenga (por quem estava apaixonado) de la doce vida difícil. Nem toda puta sonha com um Richard Gere que a trate como pretty woman ou bonequinha de luxo. Por isso todo meu apoio a ONG Davida que mantém a grife de confecção DASPU inspirada no mundo da prostituição, sem pretender tirar ninguém da profissão.



Parabéns às damas do Baixo-Augusta, do Putusp e de outros cantos.