sábado, 27 de dezembro de 2008

Mais Ranhetice (III)

"A PRAÇA (NÃO) É DO POVO".

Já falei sobre isso por aqui: quando temos iniciativa pra promover algo cultural ou esportivo, os poderes - prefeituras e governos estaduais - são os primeiros a nos desestimular com burocracias, impedimentos absurdos e descabidos. Agora, quando são eles os promotores não existe pecado abaixo do Equador. Tudo é permitido. Até mesmo bloquear a “imbloqueável” Avenida Paulista, como nos eventos que ocorrem todo final de ano neste famoso local paulistano – a Maratona de São Silvestre e os grandes shows do réveillon. Não me esqueci – e faço questão de sempre mencionar – que o último grande ato do governador Mário Covas (aquele que depois de morto virou nome de rua, de projetos sociais, de hospital estadual, de premiação de gestão pública, de rodoanel, e acreditem: de escola e fundação educacional) foi descer o porrete com sua valorosa tropa de choque particular em cima de passeata pacífica de professores da rede estadual que ocupava parte da dessa avenida em maio de 2000. Argumento do “íntegro e saudoso” governador e de seu secretário de segurança à época: “não se pode, em hipótese alguma, fechar, mesmo que parcialmente, a Avenida Paulista; lá é área hospitalar e existem leis que impedem concentrações que causem barulhos abusivos”. Uma sugestão: tente fechar a sua rua (mesmo que ela não seja uma via de intenso tráfego) pra fazer uma festa de carnaval, uma feira de arte, um show com sua banda, uma festa junina ou qualquer outro agito que te der na telha.
Anyway. É fácil entender esse modus operandi de nossos homens públicos: se for visível e se render alguma notoriedade política permitem qualquer iniciativa - e usam até o nosso dinheiro dos impostos nesses eventos; reparem que até no dia de parada gay tem prefeito acenando triunfalmente sobre algum caminhão de som.



Montagem de palco para o réveillon (deste ano) na Paulista e os prefeitos Kassab e Marta em Paradas Gays.






segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Ranhetices - Parte II (Números)


Demorei décadas pra decorar o número de meu érregê e não sei décor os números do telefone de casa e do celular. Antes de indicar meu endereço de casa penso: é 1322, 1233 ou 1223? Dentre meus ceticismos poderia eu vir a crer na mais bizarra forma de adivinhação ou em qualquer pseudociência premonitória, menos em “numerologia”. Minha birra com os números começou na infância, quando passei pra quinta série: no primário, na hora da chamada eu era eu; como que por encanto a belíssima professora Clélia pronunciava meu nome numa meiguice que a mim soava sedução, e eu, já mal intencionado, respondia “aqui, professora!” (diferentemente das outras crianças que se anunciavam com o descomprometido “presente”) Ela sabia quem eram meus pais, onde eu morava, que eu gostava de cantar, que eu detestava a canjica e o arroz-doce que serviam de merenda, que meu nariz sangrava por insolação. Na quinta série passei a ser um número na hora da chamada. A escola pública já padecia de recursos e o entre e sai de professores durante um ano letivo era rotina; os alunos não conheciam seus mestres e vice versa. Outras arrebatadoras professoras passaram durante o ginásio e nenhuma soube meu nome, nenhuma sabia coisas sobre mim; nem meu número na listagem.

E a mesma ojeriza que tenho por números, tenho por estatísticas e matemáticas. Um professor meu de Geografia disse certa vez que “números foram feitos para serem manipulados”. Hoje mesmo publicaram avaliação do MEC que mostra que alunos do sistema de ciclos (progressão continuada) têm o desempenho 0,9% melhor em matemática e 4,4% também melhor em português que alunos seriados. Oras bolas! Todo educador sabe que esses dados são inverossímeis: por mim passaram muitos adolescentes que estavam se formando no sistema de ciclos sem saber ler e ou escrever - alguns eram incapazes de entender um simples texto noticioso.
É atribuído a um antigo ministro do ditador português Salazar, o seguinte conceito sobre estatística: "Há duas maneiras de mentir: uma é não dizer a verdade; outra, fazer estatística".

Da matemática, então, nem chego perto, e não tenho a menor inveja de alguns amigos que calculam a conta do barzinho em segundos. Eu assumo: só sei décor as tabuadas de 2, de 5 e de 9. Na multiplicação e divisão uso a salvadora “regrinha de três” pra evitar vexames. Porcentagem, frações e juros, necas... Meu irmão, Gil, é craque em matemática: já participou de olimpíada estadual dessa matéria ficando entre os 100 primeiros; ele dá show quando mostra a seus pimpolhos os caminhos dessa ciência exata. Sei que meus amigos filósofos quando lerem este texto vão me descer a lenha: vão me dizer que a matemática é a “síntese da razão” ; que é o jeito humano de dizer que existe lógica nos eventos do mundo, etecétera e tal. Mas que se dane Pitágoras... eu prefiro Baco. Outro dia, um atendente de loja quase que me ridicularizou por eu não saber meu cêpeéfe; e é por isso e por outras que fico puto quando tenho que apresentar um cartão cheio de números para provar que eu, sou eu.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Vicky Cristina e Happy Christmas







Andei distante daqui devido à correria de fim de ano e por causa disso ando me perguntando por que será que todo novembro/dezembro a gente tá sempre sobrecarregado, hein? É a correria até a 25 de março pra comprar presente Made in China pros parentes, pros amigos secretos, pra namorada(o). O fim de ano, para alguns, é aquela animação, pra outros é só tédio: especial do Roberto Carlos, Missa do Galo, festa na firma (e você com vontade louca de bater no seu chefe que te sacaneou durante o ano todo), sem falar daquelas visitas inconvenientes que aparecem pra ceia de Natal.

Quando pivete eu não sentia esse corre-corre. Em casa rolava rango na véspera do dia 25 e no réveillon e só, nada de presente e nada de velho barrigudo de vermelho; expectativas pros próximos 365 dias não me causavam desassossegos. A tradição em casa quem mantinha era minha mãe: como boa costureira, nós, os filhos, estávamos sempre arrumadinhos para as ceias, mesmo se não aparecessem visitas. Por que é que eu não podia rangar de bermuda como nos outros dias do ano? Um tio meu me disse certa vez que cuidava da aparência e se vestia elegantemente não por futilidade, mas por altruísmo: por respeito ao próximo, afinal, se você é feio e se veste mal quem sofrerá com isso vai ser o outro que tem que te olhar.

Bem, mas o que eu queria mesmo falar tem a ver com o cinema: andei também distante dos bons filmes e documentários, por culpa do estresse deste período preferi produções menos pensantes, tipo: wall-e, hell boy 2, hancock, zohan entre outras cositas. E, de certa maneira, isso serviu pra que eu recuperasse o barato, a satisfação de ver um bom filme, como foi neste domingo quando assisti o inefável VICKY CRISTINA BARCELONA; um Woody Allen contando a história de duas jovens americanas, Vicky (Rebecca Hall) e Cristina (Scarlett Johansson) que viajam a Barcelona pra passar as férias de verão e acabam se envolvendo em confusões amorosas com um artista extravagante (Javier Bardem )e sua insana ex-esposa, Maria Elena (Penélope Cruz).

Assisti ao filme com a agradável impressão de que as personagens das belas Penélope Cruz, Rebecca Hall e Scarlett Johansson tivessem sido rascunhadas por Almodóvar, aliás: acho que o grande diretor espanhol se arrebatou de inveja, ainda mais pela excelente fotografia e pelo filme ter sido todo rodado em Barcelona e Oviedo - quero pensar que foi uma homenagem de Allen a Almodóvar.
Enfim. Um antigo clichê proferido pela personagem aventureira Cristina (de Johansson) que ao encarar a vida dizia “não saber o que queria, mas sabia exatamente o que não queria” serve de alento pra suportar esse período e essa p... toda.