domingo, 15 de agosto de 2010

Bienal de Livros???

Depois da FLIP em Paraty fui, nesta sexta, ver a Bienal do Livro daqui de Sampa. Ufa! Caminhei mais de 4 horas entre livros. Ops, eu quis dizer entre “vendedores” de assinaturas de revistas. Um fato chato que se repete a cada bienal é a proliferação dos “espertos” vendedores de assinaturas de todo tipo de revista. Espertos porque inovam cada vez mais suas abordagens – chegando a irritar meu pobre saquinho. A tática dessa vez é interpelar a vítima perguntando se ela já recebeu as “cortesias” de sua revista. Daí arrastam o mané para a estande para convencer o coitado. Dica: se você vai a Bienal se prepare para essa pentelhagem.

Outra coisa: cadê os vantajosos “descontos” das editoras? Penso eu que o legal desses eventos, para quem é leitor, é o desconto nos livros. Se o beneficio não existe, então, pra que uma bienal de livros? Os descontos que vi nesta sexta não refrescam o bolso de quem curte leitura, aliás, os pequenos e ridículos abatimentos rolavam apenas em edições desprezíveis de pouca circulação (melhor dizendo, só em “lixeira”). Outra coisa que proliferou neste ano foi a participação de editoras dedicadas à publicação de todo tipo de crença; até os seguidores da Cultura Racional, aquela seita na qual o grande Tim Maia se enchafurdou nos anos 70, montou estande.

Por fim, o que salva esse tipo de evento é o encontro do leitor com seus autores diletos, mas quando descubro que padre Marcelo e Regina Duarte estão entre os convidados daquele dia, sinto uma sensação de arrependimento. Eita, meu saco.
Um tema recorrente nos debates literários (Flip e Bienal) é o futuro do livro, que alguns dizem ameaçado pelos E-books (kindle, Ipads e etecétera...). Chamam tecnólogos, professores, escritores, especialistas de tudo quanto é coisa pra falar do assunto, sendo que a formação do leitor, isso sim, um tema crucial, acaba negligenciado.
Enfim, não cabe a mim desestimular aqueles que queiram conhecer a Bienal de Livros de 2010. Na verdade eu desejo boa sorte a todos. Que todos possam prestigiar o evento, sem aborrecimentos. Que voltem com as sacolas cheias e não de saco cheio.

sábado, 7 de agosto de 2010

Sábado-Feira em Paraty

Logo de manhã, aqui em Paraty, tem o britânico Terry Eagliton que veio rebater o que o cientista Richard Dawkins, que esteve na Flip2009, escreveu sobre religião; Richard é um darwinista elaboradíssimo, então vai ser porrada, e eu quero ver – essa eu não perdo.

Hoje é dia do excêntrico cartonista Robert Crumb (a segunda estrela da Flip 2010, depois de Isabel Allende). Conheci o trabalho e a importância de Crumb através de leituras sobre contra-cultura e cultura pop dos anos 60 e 70. Aqui em Paraty ele fez sucesso entre crianças e adolescentes (e muitos marmanjos aussi) – vou vê-lo, mas sem paixões, já que sou um ET que viu pouco quadrinho na vida.

Quero ver, e com entusiasmo, a homenagem a Drummont por Antônio Cícero, Chacal, Ferreira Gular. Eles farão leitura de poemas do primeiro livro de Drummont, “Alguma Poesia (que completa 80 anos em 2010)”. Mais à noite tem o documentário “José & Pilar” de Miguel Gonçalves Mendes sobre José Saramago. Esse longa, que é uma homenagem da Flip a Saramago, ainda não entrou em cartaz no Brasil.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Paraty: segundo dia.

Acordei com uma leve ressaca (foi a Coqueirinho paratiense a culpada). Chovia enquanto tomava café da manhã, mas o sol finalmente deu as caras (tá um pouco tímido ainda). Daqui a pouco vou tomar uma aguinha de coco pra rebater e recuperar a dignidade. Cerva e mais Coqueirinho só for mais à noite.

Tenho mesa de debate às 15h30 com o Reinaldo Moraes. Sou leitor assumido do cara. Já disse isso: Reinaldo, Marcelo Rubens Paiva e Caio Fernando Abreu são responsáveis por eu gostar de narrativas soltas, sem lirísmos, ou outras firulas. Revolucionaram a cabeça e a escrita do Zequinha desde os anos 80.

Como assinante e leitor, eu vivo me queixando da Falha de S. Paulo, agora vejam minha contradição: estou tomando cafezito, lendo jornal e usando wifi da Falha tudo digratis. Tem estande que o periódico montou ao lado da tenda do telão. É mole?
Evolução: consegui entrar na internet no celular, mas operar o Facebook por ele tá flórida. Eita.

First Day em Paraty

O sol não deu as caras neste primeiro dia em Paraty, e como se podia prever, o centrinho histórico estava repleto de tucanos ansiosos pela palestra de abertura do mestre FHC (por todos cantos nos esbarramos em madames de Higienópolis) . Ele vai falar sobre Gilberto Freyre, um sociólogo que só agora ganha destaque acadêmico, depois de passar muito tempo no limbo, por culpa do apoio aos milicos em 64 e por ter um pezinho no fascismo. (Meu amigo Wagner me soprou essa: a Petrobras, nas mãos agora do PT, não patrocinou a Flip 2010 por causa dessa tucanada.)

Arthur Nestrosvisk convidou talentos de vários cantos do Brasil e do mundo para a abertura musical da Flip 2010, tava bacana, mas não trouxe Celso Sim, com quem esteve em turnê por Portugal recentemente. É uma pena... eu adoro a voz de Sim. Eu digo "Sim"!!! O show do Edu Lobo deu sono, preferi ficar na companhia de um simpático cão vira-lata que me deu atenção e carinho, mas como todo outsider que se preze, o danado me abandonou depois de me conquistar.

A Falha de S. Paulo, em sua estande, liberou café e capuccino digrátis neste primeiro dia; leitores e assinantes do periódico, como eu, agradecem a mamata. E por falar nisso, a gente encontra um monte de famosidade pelos cafés de Paraty (tem globais por todo o lado). Fico por aqui. Logo volto com mais veneno. Eita.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Festança Literária

Amanhã, quarta-feira, estarei na FLIP em Paraty - farei aqui diariamente críticas, elogios e xingamentos do evento. Informes diretos dos locais dos acontecimentos flipísticos ou de qualquer canto bacana da cidade (até dos bares onde, com certeza, me esbaldarei com as famosas cachaças paratienses. Eita!).


segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O MISSISSIPPI É AQUI

No começo dos anos 90 fui entrevistar um cara para o Jornal do Butantã numa rua estranhamente pobre do Rio Pequeno, perifa de Sampa. Ruas pobres por lá não são nada estranho devido às desigualdades que todos conhecem bem, mas naquela rua havia algo anormal, diferente; aquela rua possuía alma. Uma alma blueseira. Um Robert Johnson que atendia a todos, com fineza, por Ismael Costa. Dizem que Johnson fez pacto com o tinhoso, vendendo a alma para ser o virtuoso que foi (história que ele mesmo narra na canção “Me and The Devil Blues”), dizem que até os 16 anos trabalhou no campo, depois seguiu carreira musical, se metendo em bebedeiras, brigas e prisões. Dizem também que era dado a conquistar e a espancar as mulheres com quem se envolvia - há a lenda de que ele teria sido envenenado (e morto precocemente aos 27 anos) por algum marido ciumento.

Já o bluesman Ismael Costa, daquela rua estranha do RP, trabalhava honestamente há muito tempo no CAU (Centro Administrativo do Unibanco) na Rodovia Raposo Tavares, no Km 15 (onde meus três irmãos mais velhos que eu também trabalharam). Ismael construiu uma edícula num "barranco" onde morava com a esposa; aonde seus poucos e interessados alunos iam aprender sobre o ritmo que influenciou Jazz, Rock, Rhythm and blues, Soul music, e o Pop também. Orgulhoso, me contou como construiu seu inseparável violão Dobro metálico; como o fez e por onde andou para comprar cada componente. Apesar da infância paupérrima, me falou dos caras malucos (com grana) que conheceu nos anos 70, cujos pais traziam discos de Blues da Europa ou dos EUA, mexendo para sempre com o gosto musical de Ismael. Nesta entrevista descobri John Lee Hooker, Son House e Robert Johnson, pai, filho e espírito santo para o blues boy Ismael. Me falou do sonho de conhecer o Estado do Mississippi que o remeteria à origem Blues.

Em 1995 organizei alguns eventos musicais num pequeno restaurante do qual fui sócio, realizando uma noite dedica ao Blues; é lógico que Ismael Costa não poderia ficar de fora. Outros músicos também se apresentaram, mas a noite foi de Ismael. Todos de boca aberta aos primeiros toques daquele Dobro metálico, todos atentos à voz rouca de velho blueseiro de Chicago ou do Mississippi. Era como se Robert Johnson tivesse reencarnado naquele cara, lá naquele pequeno bar e restaurante do Rio Pequeno. O fim daquela noite terminou numa inesquecível jam session com todos os músicos no palco, com Ismael de destaque principal.

E no sábado passado, num boteco da esquina da Capote Valente com a Teodoro Sampaio, meu amigo Marcinho (guitarrista da honesta banda roqueira MandaChuva) me contou que Ismael Costa morreu há mais de quatro anos. Fiquei triste pra cacete. Assim como eu, muita gente achava que o lugar devido a Ismael seria o reconhecimento, um lugar entre os melhores músicos brasucas. Não rolou isso e nem a sua sonhada viagem ao "Delta" do Mississippi. Generoso, doou sua gaita diatônica pouco tempo antes de morrer ao outro membro da Mandachuva, ao meu amigo Rinaldo.

Diferentemente de Robert Johnson, Ismael não se envolvia em brigas, era calmo demais para isso. Não bebia mais que uma dose de conhaque durante qualquer apresentação. Acho que nunca espancou mulher alguma, mas morreu triste e solitário, como num solo de Blues, depois que a esposa o deixou. O baque foi doloroso. Dizem que Ismael degringolou depois da separação, parece que enfiou os dois pés na jaca: tem gente que diz que ele estava consumindo de tudo. Não sei por que, mas me consolei quando Marcinho asseverou depois de sorver outro doloroso gole de sua cerveja: “Zeca, eu não tiro a razão da esposa, e nem a de Ismael ao escolher o seu final.”

PS: num papo sobre o nosso bluesman (depois de escrever este texto), o meu amigo Old me soprou a estória de que Ismael fora integrante da “Santa Gang”, banda que abriu diversos shows da jurássica “Made in Brazil” lá nos anos 70.


(Na foto, O vellho bluesman Ismael e seu violão Dobro, acompanhado por Ailton Rios, na gaita)