terça-feira, 12 de agosto de 2008

Espírito Esportivo e os Vira-latas.


Vou proferir um bocado de xingamentos (desaforentos) no dia em que eu encontrar aquele meu professor (se é que posso chamá-lo disso) de Educação Física do Colégio Daniel, em Little River. Bom, mas nem de “Educação Física” posso me referir àquilo que esse professor oferecia a seus alunos em meados dos anos 80 do século passado. Jamais esquecerei seu nome e sua fisionomia, mesmo que eu o encontre velho e debilitado. É trauma da pior qualidade. O cara ensinou o que é “complexo de vira-lata” a sua turma de alunos. E nós aprendemos – desgraçadamente – na prática.

O que ele considerava “aula” de Educação Física consistia em dividir as molecadas (naquela época homem não dava aulas às meninas) pra formar vários times de futebol de salão, de vôlei e de basquete. Botava todo mundo pra correr em volta da quadra (como única forma de aquecimento) e depois entregava a devida bola pra que se iniciasse a partida da modalidade que seria aplicada no dia. Fundamentos, técnicas, alongamentos, preparação física, a gente nunca teve com esse professor (e tivemos que suportá-lo até o fim do ginasial).

Entre nós até que não havia aborrecimentos, já que vínhamos todos da mesma classificação social, com desajustes culturais, físicos e econômicos semelhantes. Mas nosso “amado” mestre de Educação Física era um “sádico-social”, com uma “sociopatia” dirigida exclusivamente aos não-privilegiados. Atingia o êxtase vendo-nos sucumbir diante de adversários superiormente bem nutridos, fisicamente e tecnicamente preparados pra qualquer prática esportiva.

Tomamos vareios homéricos no futebol, no basquete e no vôlei de colégios como Bandeirantes, Santa Cruz, Aplicação da USP, entre outros. Lembro até hoje da gente (os pobres e derrotados atletas do Daniel) voltando pra casa de busão (sim, não tínhamos nem que nos levasse pra esses enfrentamentos) com a cabeça baixa e com uma tristeza estranha no olhar – havíamos deparado com o “conflito entre classes” através do esporte.

Por isso eu nunca acreditei nessa balela de “espírito esportivo”. Digo sempre que acho legal praticar esporte e não tenho nada contra quem se dedica a isso. Só me recuso a acreditar em “competição esportiva” – e não me venham dizer que no esporte a competição é "saudável". Saudável é o escambau... Bota um sujeito americano concebido e criado com leite tipo “A” pra competir com um esforçado atleta oriundo da Vila Dalva (no Rio Pequeno): vai ser gozação.

E isso tudo que digo é pra deixar claro que já estou de saco-cheio dessa olimpíada de Pequim. Não suporto ver as vinhetas da poderosa Globo (e dos outros canais também) glorificando a toda hora o tal “espírito esportivo”. No dia da cerimônia de abertura vi Orlando Silva, o ministro dos Esportes, ao lado de Carlos Nuzman, presidente do COB (Comitê Olímpico Brasileiro), dando entrevista coletiva e se gabando de que o Brasil levava a maior delegação da nossa história a Pequim - sem comentar, é claro, que só 12% de nossa rede escolar tem quadra esportiva.

E tem mais: esses atletas todos que vão representar o Brasil são abnegados; sem apoio, boa parte, dependeu de esforço e empenho próprio pra chegar a esta olimpíada. Alguns contam com “vaquinha” feita entre os amigos pra adquirir as passagens de ida e volta da China E durante as competições serão humilhados por nações que bombam seus competidores com todo tipo de droga pra que defendam a todo custo o orgulho pátrio (não dá pra esquecer o caso do bombado americano Lance Amstrong, heptacampeão da Tour de France, que nunca foi molestado pelos agentes da comissão anti-doping, que por coincidência também eram norte-americanos) .

Enfim. Não tenho paciência nem espírito (esportivo) algum pra acompanhar o desdém do primeiro mundo contra os vira-latas.

2 comentários:

marisa disse...

Zeca, também não suporto mais Olimpiada, Galvão Bueno, e sensacionalismo sobre a vida de nossos atletas. Todo ano é sempre do mesmo jeito.

ZECA LEMBAUM disse...

Acordar ouvindo o Galvão berrar é foda, mesmo.